“Com o volume de trabalho que tinha”, Polícia Judiciária “nem tentou abrir” os ficheiros de Rui Pinto
Especialista da Judiciária revelou que, apesar de ter sido apreendido sem encriptação, continha alguns ficheiros que não eram de livre acesso e sobre os quais a PJ não tomou a iniciativa de abrir.
06.10.2020 às 13h01

Rui Pinto enfrenta em julgamento uma acusação com 90 crimes.
Sonja Och / Der Spiegel
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A Polícia Judiciária (PJ) não tentou abrir alguns ficheiros encriptados que estavam no disco desbloqueado de Rui Pinto - identificado como RP3 – devido ao grande “volume de trabalho” na investigação, admitiu hoje o especialista José São Bento.
Na audição desta manhã, na nona sessão do julgamento, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, abreviada por uma falha inicial no sistema eletrónico e pelo rápido testemunho, o especialista da Judiciária que se dedicou à análise deste disco rígido revelou que, apesar de ter sido apreendido sem encriptação, continha alguns ficheiros que não eram de livre acesso e sobre os quais a PJ não tomou a iniciativa de abrir, mesmo após se iniciar a colaboração com o arguido.
“Com o volume de trabalho que tínhamos, nem os tentámos abrir. Continuamos sem saber [o que tinham]. Eram alguns ficheiros espalhados, não eram muitos e não os tivemos em conta”, frisou José São Bento.
Questionado pela defesa de Rui Pinto sobre a localização original do computador, a partir do qual foi feita a cópia para o disco RP3, o especialista reconheceu que “não é possível aferir” o local.
O tema foi alvo de insistência por parte do coletivo de juízes, que quis perceber se era viável determinar com precisão a geolocalização dos dispositivos, mas o especialista da PJ apenas explicou que era possível estar tanto em Budapeste, como noutro lugar.
O julgamento do processo Football Leaks prossegue hoje de tarde com a audição de outro especialista da Polícia Judiciária, Afonso Rodrigues.
Rui Pinto, de 31 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada.
Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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