Sobre a simplicidade das coisas - e não há nada mais simples do que um jogo de futebol
Duarte Gomes escreve sobre o que realmente importa e como devem comportar-se os agentes que vão a jogo num jogo grande como o de domingo, entre o Benfia e o FC Porto
05.10.2018 às 10h00

Carlos Rodrigues
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No futebol como na vida, as coisas podem ser simples. Muito simples. Peguemos num exemplo atual: o clássico do próximo domingo, entre Benfica e FC Porto. É mais um jogo importante, com história e pergaminhos, que se perspetiva intenso, animado e disputado.
Os jogadores, verdadeiros atores deste filme, têm uma missão muito clara: vencer o adversário, colocando em prática estratégia coletiva, inspiração momentânea e talento individual.
Árbitros e treinadores, os outros dois intervenientes diretos na partida, têm missões semelhantes: os primeiro tentarão zelar pelo cumprimento das regras. De preferência, com respeito e desportivismo.
Têm obrigação de se preparar física, mental e emocionalmente e de obedecerem, apenas e só, à sua consciência. Devem ser a neutralidade em pessoa e exercer a sua missão com máxima seriedade, competência e enorme sentido de justiça.
Os segundos tentarão ganhar os três pontos. De preferência, proporcionando bom espetáculo, jogando bom futebol.
São fundamentais na conduta dos seus jogadores e, quando jogam em casa, têm responsabilidade acrescida quanto ao comportamento dos seus adeptos. Devem lutar pela vitória, com responsabilidade, caráter e personalidade.
Por último, os adeptos. Os adeptos, que são quem verdadeiramente sustenta a indústria, têm direitos e deveres. Têm o direito a assistir ao maior e melhor espetáculo possível e de vivê-lo intensa e apaixonadamente. São eles que pagam as quotas, os bilhetes e os canais pay-per-view. Têm, pois, direito a libertar as suas emoções e a entregar ao jogo toda a cor, magia e emoção.
Por outro lado, têm o dever - cívico - de se comportarem como pessoas. Pessoas de bem.
Não gostar, discordar ou criticar faz todo o sentido. Vandalizar, bater, ofender, perseguir, magoar e ameaçar... não.
No futebol, há sempre espaço para quem vem por bem. Não há, não pode haver lugar para usar o jogo como pretexto para cometer crimes.
Simples, não é? Agora vamos ao outro lado.

Gualter Fatia
O que se espera dos restantes intervenientes - responsáveis dos clubes, generalidade da imprensa, comentadores desportivos (onde agora me incluo) e afins - é que cumpram a sua função de dirigir, descrever e opinar/criticar, com sentido ético, respeito e independência.
O futebol do vale-tudo não é compatível com um estado de direito democrático, com um país livre e igual para todos. É terceiro-mundista.
É a antítese do que deve ser um universo que movimenta tantos recursos humanos, técnicos e materiais.
O futebol em Portugal é uma indústria que fatura centenas de milhões de euros por ano. É a maior e mais visível montra do país. É o exemplo maior de jovens, meninos e meninas, que anseiam por imitar os seus ídolos e crescer para ser como as suas grandes referências.
Os dirigentes dos clubes, não apenas destes mas de todos - têm essa noção e por isso sabem que recai sobre isso tremenda responsabilidade social.
Sem prejuízo de defenderem intransigentemente as suas cores, têm o dever de manter uma conduta digna e um comportamento correto.
Devem evitar guerrilhas verbais que intoxicam o povo e que nada contribuem para pacificar o ambiente. Devem evitar estratégias desonestas ou condutas pouco claras, que os desprestigia. A eles e às instituições que representam.
Devem respeitar-se mutuamente. Devem saber perder e saber vencer. Devem perceber que há muitos adeptos que pensam pela sua cabeça. Devem gerir o rumo das suas equipas, honrando dignamente o voto de confiança que lhes foi dado em ato eleitoral.
No fundo, os dirigentes do futebol moderno, por força do seu mediatismo e das marcas que representam, têm a obrigação moral de serem pessoas exemplares.
A imprensa é o maior veículo de ligação entre quem está lá dentro e quem está cá fora. Tem o direito a aceder à maior informação possível e o dever de a reportar fatualmente. A imprensa tem que ser corajosa e ética. Muito ética. Deve trabalhar com a verdade, para a verdade, pela verdade.
Não pode servir outro interesse que não o interesse público. Deve saber manter distâncias entre o que gosta e o que faz. Entre o que sente e aquilo que tem que publicar para o exterior. Um bom jornalista respira independência e isenção. É firme, corajoso, coerente. É livre. Por isso, é respeitado. É o maior jogador da sua equipa, nunca o ponta de lança de outra.
Os comentadores generalistas (não os associados às equipas) têm idêntica missão: opinar de forma clara, consciente e ética. Devem dizer o que pensam, sem receios nem dependências. Devem ser fiéis às suas ideias, não subservientes ao que sugerem os outros. Devem ser tão factuais quanto possível, fundamentando cada raciocínio de forma a que todos entendam, ainda que discordem. Ainda que não gostem.
No futebol como na vida, é tudo muito simples.
Por trás de cada jogador, árbitro, adepto, dirigente, jornalista ou comentador mora uma pessoa. E se essa não tiver valores, o que produzirá será sempre dúbio e quase sempre nocivo, tóxico e imoral.
O futebol será tão melhor quanto a integridade de quem o joga, arbitra, dirige, aplaude, comanda, critica e comenta.
Tão simples, não é? Por que é que custa tanto?
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